Da Redação Avance News
Um processo inovador desenvolvido por cientistas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), utiliza mel de abelhas sem ferrão para extrair com mais eficiência das cascas das amêndoas de cacau teobromina e cafeína – dois compostos que podem ser aplicados em alimentos e cosméticos.
As cascas de cacau são particularmente ricas em teobromina e cafeína. No entanto, os métodos convencionais de extração frequentemente envolvem o uso de solventes que podem ser prejudiciais à saúde e ao ambiente, além de serem, geralmente, complexos e demorados.
A invenção foi liderada por Felipe Sanchez Bragagnolo, que tem como hobby a criação de abelhas sem ferrão (Melipona quadrifasciata, a mandaçaia), prática conhecida como meliponicultura.
O trabalho, que faz parte do projeto de pós-doutorado de Bragagnolo, contou com a colaboração de Monique Martins Strieder e Leonardo Mendes de Souza Mesquita, com a supervisão de Maurício Ariel Rostagno. O grupo recebe apoio da Fapesp em suas pesquisas .
“A inovação proposta oferece um método de extração assistida por ultrassom de alta intensidade e utiliza mel de mandaçaia como solvente natural. Essa abordagem não apenas elimina o uso de solventes orgânicos prejudiciais, mas também simplifica o processo de extração, reduzindo o tempo necessário e tornando-o mais sustentável”, afirma Rostagno, agrônomo formado pela Universidade Federal de Lavras (Ufla) e inventor de 17 patentes.
Rostagno também é mestre em ciência de alimentos pela Ufla, mestre em vitivinicultura e doutor em química pela Universidade de Cádiz (Espanha).
Resíduos valiosos
Os resíduos agrícolas têm sido cada vez mais reconhecidos como fontes valiosas de compostos de interesse. A teobromina, estimulante do sistema nervoso central, é o principal composto presente no cacau, com ação semelhante (embora mais suave) à da cafeína.
“Tradicionalmente esses resíduos são descartados ou subutilizados. Ao extrair esses compostos não só reduzimos o volume de resíduos agrícolas, mas também promovemos a economia circular e mitigamos o impacto ambiental do desperdício”, diz Mesquita, que é professor associado na Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA-Unicamp), no campus Limeira.
Ele atua na área de tecnologia, composição e análise de alimentos, no Laboratório Multidisciplinar em Alimentos e Saúde (LabMAS).
Um dos princípios da chamada química verde é eliminar solventes tóxicos e contaminantes de processos e produtos.
“Apesar de o uso de solventes como metanol, acetona e hexano ser permitido, ainda ficam resíduos no alimento que podem ser prejudiciais à saúde e devem ser evitados. Não só tendo em vista o consumidor, mas também o pessoal técnico responsável pelo processo de extração, sujeito à exposição por contato ou vapores”, explica Rostagno.
O mel de abelhas sem ferrão, além de ser um solvente natural, apresenta uma série de benefícios à saúde, como propriedades antibacterianas, antioxidantes e nutritivas. Assim, segundo o inventor, sua utilização como solvente não apenas torna o processo mais sustentável, mas também enriquece o produto final com um potencial único de utilização em uma variedade de produtos.
“Pode ser incorporado em formulações cosméticas, aproveitando suas propriedades para promover a saúde da pele e do cabelo”, exemplifica o pesquisador. Também pode ser utilizado como ingrediente em produtos nutracêuticos, fornecendo um impulso natural de energia.
Ao utilizar a técnica de extração assistida por ultrassom em conjunto com o mel de abelhas sem ferrão, a eficiência do processo é amplificada, resultando em extrações mais rápidas e com maior rendimento de teobromina e cafeína. “Além disso, o extrato final não requer secagem, simplificando ainda mais o processo.”
Há ainda um ganho de marketing, segundo o pesquisador, visto que, além da eficiência e da sustentabilidade na extração de compostos valiosos, há uma valorização da biodiversidade local, já que o mel da abelha mandaçaia é utilizado. “Isso contribui para a diferenciação e autenticidade dos produtos”, diz Rostagno.