Governo Lula exige retratação formal e espera recuo do Carrefour após declaração sobre carne brasileira
O governo brasileiro cobra do Carrefour uma retratação formal das declarações que o CEO global da companhia, Alexandre Bompard, fez a respeito da carne dos países do Mercosul, incluindo o Brasil. Na semana passada, em um comunicado direcionado a produtores franceses, ele anunciou que a empresa vai parar de comprar a carne da região e questionou o padrão de qualidade do produto.
“O movimento de prestigiar os produtores franceses é legítimo. O problema é quando ele fala em não cumprimento de regras sanitárias. Aí não aceitamos. Eles compram a carne brasileira há 40 anos”, disse o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, ao blog.
A avaliação de integrantes do Ministério da Agricultura, do Itamaraty e do Palácio do Planalto é que a reação dos produtores brasileiros, que decidiram parar de fornecer carne ao Carrefour também no Brasil, foi rápida e necessária. O Carrefour no Brasil afirmou que está “em diálogo constante na busca de soluções que viabilizem a retomada do abastecimento de carne”.
A leitura do governo é que, se não houvesse uma resposta firme, outros países ou blocos poderiam questionar também a carne do Brasil e dos vizinhos, gerando um efeito em cascata. A aposta no governo Lula é que, diante da resposta brasileira, o Carrefour tende a moderar sua posição.
“A reação do agro brasileiro foi forte, como tem que ser, diante de um ataque à imagem da carne brasileira, sem qualquer justificativa, por protecionismo puro e simples, como se já não bastassem tarifas e outras barreiras existentes há décadas”, afirmou um diplomata ao blog.
A Embaixada da França no Brasil entrou em contato com o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, e se ofereceu para mediar o imbróglio. A representação diplomática negocia uma reunião entre representantes do governo brasileiro e o CEO do Carrefour ou uma nova declaração do executivo para tentar contornar a situação.
Já a Embaixada brasileira em Paris se manifestou oficialmente, por meio de nota, lamentando as declarações de Alexandre Bompard.
“A referida comunicação reflete entendimento e temores infundados sobre a sustentabilidade e a qualidade dos produtos ofertados pela agropecuária brasileira, os quais não se coadunam com a prática de negócios do próprio Carrefour que, diariamente, oferece esses mesmos produtos a seus mais de 2 milhões de consumidores brasileiros”, diz um trecho (veja abaixo o texto na íntegra).
O cerne do embate entre o Carrefour e os produtores sul-americanos é o acordo comercial entre Mercosul e União Europeia. Os agricultores e pecuaristas franceses sempre pressionaram o governo de Emmanuel Macron a não concluir o acordo. Na visão do Itamaraty, no entanto, o embate não deve evoluir para uma crise diplomática, já que Brasil e França possuem uma relação muito boa.
Veja a nota da embaixada do Brasil na França sobre o assunto:
Nota à Imprensa
Embaixada do Brasil em Paris
“O governo brasileiro lamenta publicação recente do Sr. Alexandre Bompard na rede social X a respeito da decisão do Carrefour de suspender a compra de carnes com origem nos países do Mercosul.
A referida comunicação reflete entendimento e temores infundados sobre a sustentabilidade e a qualidade dos produtos ofertados pela agropecuária brasileira, os quais não se coadunam com a prática de negócios do próprio Carrefour que, diariamente, oferece esses mesmos produtos a seus mais de 2 milhões de consumidores brasileiros, bem como sobre eventual risco aos produtores e consumidores europeus decorrente de importações do Mercosul.
No intuito de combater esta patente desinformação, o governo brasileiro tem o dever de esclarecer que:
É falsa a declaração de que há risco de “transbordamento de carne do Mercosul no mercado francês, que não respeita as suas exigências e normas”.
A União Europeia consome 6,5 milhões de toneladas de carne bovina por ano, das quais apenas 5% é importada. A Europa exporta mais carne do que importa. A quota de carne bovina oferecida ao MERCOSUL corresponde a apenas 1,5% do consumo europeu.
O acordo comercial entre MERCOSUL e União Europeia não compromete os elevados padrões produtivos e sanitários adotados em ambas as regiões.
O Brasil orgulha-se de ser, há décadas, fornecedor seguro de proteína animal ao mercado europeu, bem como de sua capacidade de atender plenamente às exigências e controles sanitários de mais de 160 países, incluindo os rigorosos controles da União Europeia.
Além disso, cabe observar que os produtores brasileiros estão sujeitos a normas de sustentabilidade e produção frequentemente mais rigorosas do que as da UE. Nosso Código Florestal reserva entre 20 e 80% da área total das propriedades rurais para preservação da vegetação nativa (80% em todo o bioma amazônico), cifras sem paralelo na regulação ambiental europeia.
O Brasil respeita, democraticamente, a oposição de qualquer setor ao acordo de livre comércio Mercosul-União Europeia. Tal posição, no entanto, não pode justificar uma campanha pública baseada na disseminação generalizada de desinformação contra produtos brasileiros.”
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