Ao participar, nesta quinta-feira (29), do X Seminário de Planejamento Estratégico Sustentável do Poder Judiciário (X SPES), a diretora-executiva do Departamento de Pesquisas Judiciárias do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Gabriela Moreira de Azevedo Soares, informou que houve uma queda brusca nos gastos dos tribunais entre 2020 e 2021, por conta da pandemia da Covid-19 e da implementação do trabalho remoto.
O seminário, promovido pela Assessoria de Gestão Sustentável do Superior Tribunal de Justiça (STJ), prossegue nesta sexta-feira (30).
Gabriela Moreira apresentou os dados durante o painel “Balanço de Sustentabilidade do Poder Judiciário”. Segundo ela, os valores aumentaram em 2022, mas ainda ficaram distantes do nível de 2019. “Isso mostra, na minha avaliação, uma possível mudança de cultura no Judiciário”, opinou. Em comparação com 2019, a diretora apontou a economia de 15% nos gastos totais, sendo as maiores reduções nos gastos com papel (65%), copos (47%) e energia (21%), o que gerou uma economia de R$ 26 milhões.
Adriana Moreira Tostes Ribeiro, coordenadora de Gestão Estratégica e Sustentabilidade do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT), comentou que a sustentabilidade é um grande desafio, por abranger desde redução de gastos até questões de equidade e diversidade, passando pela necessidade de se fazer um inventário da emissão de gases de efeito estufa.
Inventário é passo inicial para gerir emissões na organização
Guilherme Lefèvre, do Programa Brasileiro GHG Protocol, da Fundação Getulio Vargas (FGV), foi um dos palestrantes do painel “Metodologia para Inventário de Emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) – Resolução CNJ n. 400/2021”. Segundo ele, o inventário é o passo zero para gerir emissões organizacionais. “É mais importante internalizar a cultura de coleta de dados nas organizações, bem como a busca por soluções dos problemas levantados, do que os resultados em si”, declarou.
Ele explicou que o método GHG Protocol é o mais utilizado no mundo e divide as emissões em três escopos, entre diretas e indiretas. As emissões de Escopo 1 ocorrem dentro da organização, como as causadas pelo ar condicionado; no Escopo 2, estão as associadas à energia elétrica, e o Escopo 3 se refere à contratação de frete, deslocamento até o trabalho e compra de produtos e serviços.
A juíza Rafaela Santos Rosa, da Justiça Federal do Rio Grande do Sul, lembrou a importância de cumprir as metas de redução de emissão de gases de efeito estufa para evitar as mudanças climáticas e os eventos severos do clima. Além das razões científicas, a juíza apontou a necessidade de se cumprir o Acordo de Paris – reconhecido como norma supralegal –, bem como a Resolução CNJ 400/2021, que determina aos órgãos do Judiciário a implementação de planos de compensação ambiental até 2030.
“Hoje não há mais uma discricionariedade das unidades do Poder Judiciário para realizar medidas de controle das suas emissões, elas devem fazer isso. E tudo começa com os inventários”, observou. Ao falar sobre o inventário da Justiça Federal do Rio Grande do Sul, a juíza destacou que o maior desafio são as emissões de Escopo 3, que correspondem à maior parte das emissões (81,3%).
Padronização das ações de governança socioambiental
O terceiro painel do X SPES, “A Norma ABNT PR 2030 – Uma discussão sobre ESG e sustentabilidade”, enfatizou a necessidade de padronização das ações de governança socioambiental para dar efetividade a essas iniciativas. O painel teve como mediadora a advogada da União e doutora em ciência ambiental Teresa Villac Pinheiro, que apontou o aumento da complexidade da administração pública como o motivo de ela ser essencial no combate às mudanças climáticas. “Esse seminário enriquece nosso conhecimento é já é referência no poder público federal”, acrescentou.
O primeiro palestrante, o professor da FGV e doutor em energia Edson Fernando Escames, esclareceu o conceito ESG (Environmental – Ambiente; Social – Sociedade; e Governance – Governança) como multidisciplinar, utilizado por empresas para definir e aplicar a governança socioambiental. “É diferente da sustentabilidade, focada nos impactos ambientais e sociais e com pensamento não financeiro. A ESG foca no resultado financeiro e na criação de valor econômico; pensa no risco para o negócio e na criação de reputação”, observou.
Para o palestrante, é importante criar uma padronização do ESG para evitar a prática do greenwashing: “O greenwashing é quando empresas e outras entidades pretendem assumir práticas ambientais, mas isso não passa de uma maquiagem socioambiental”.
Ele também destacou o “pensamento circular” na produção, com uso mais racional de recursos, controle de resíduos, reciclagem e controle da emissão do carbono. “Mas tudo isso depende da boa governança, que começa com transparência, prestação de contas e adoção de práticas de responsabilidade social”, comentou. Segundo Escames, isso trará benefícios a longo prazo para as empresas, como melhoria da imagem, retenção de talentos, fidelização de consumidores e outros. “Eu concluo com uma reflexão do futurista Ricardo Mattos: ‘Quem não se inspira nas utopias resolve o presente com as ferramentas do passado'”.
Ocorrências climáticas revelam quadro de emergência ambiental
O segundo palestrante foi Nelson Al Assaf, diretor de normatização da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT). Ele afirmou que a padronização é essencial para a gestão racional e, portanto, sustentável. “A ABNT é uma entidade privada, mas aberta para sociedade, produtores, governo e outros”, enfatizou. Ele apontou que já estamos em uma emergência ambiental.
“Em janeiro deste ano, foi registrado o dia mais quente da história da Europa. Em fevereiro, tivemos enchentes recordes em São Paulo. O Canadá está tendo seu pior incêndio florestal. Tudo isso são efeitos do aquecimento global”, alertou. Ele afirmou que a ciência já mostrou que somos os maiores causadores disso, com uma emissão de 36 bilhões de toneladas de CO2 na atmosfera.
A Norma 2030 é essencial para mostrar quais práticas são realmente necessárias para a aplicação da ESG. “Nos baseamos nas normas ISO, em outras normas da ABNT e em discussões com a sociedade, as empresas e o governo”, comentou. Assaf afirmou que é necessário pensar que o eixo “social” da ESG é seu objetivo final. “A norma tem um total de 42 critérios, sendo 14 ambientais, 15 sociais e 13 de governança. Ela está focada no autoconhecimento da entidade e na criação de indicadores”. Ele observou que já estão em trabalho a segunda, a terceira e a quarta parte da ABNT PR 30, que trarão respectivamente materialidade, implementação e indicadores/relatórios da governança socioambiental.
Nelson Al Assaf acrescentou que o Judiciário, e o STJ em particular, já tem adotado diversas práticas e políticas muito importantes. “O Estado tem um poder indutor significativo, seja pelo peso econômico, seja pelo seu exemplo”, concluiu.