A luta dos povos indígenas passa também pela demarcação de territórios no mundo das artes. O momento que eles estão vivendo é inédito na cultura brasileira, com grande número de exposições nos principais museus de arte do Brasil. Um dos mais importantes, o Museu de Arte de São Paulo (Masp), escolheu como centro de sua programação, para este ano, exposições e atividades relacionadas à cultura indígena.
“Eu acho que é um ganho muito grande para a gente, para nós indígenas e para a sociedade não indígena também”, defende a artista plástica Kássia Borges Karajá. “Antigamente, a nossa arte ficava restrita aos museus etnográficos, como se a gente tivesse morrido, como se só existissem objetos para contar a história desse povo que morreu! Só que nem toda etnia foi extinta”, avalia a artista, que faz parte do trio de curadores indígenas convidados pelo Masp.
No primeiro semestre deste ano, o museu dedicou espaço para duas grandes exposições de artistas plásticos indígenas: a do coletivo Mahku (Movimento dos Artistas Huni Kuin), que reúne representantes da maior etnia indígena do Acre, além da própria Kássia Borges Karajá, que entrou para o grupo em 2018. O Mahku foi criado dez anos atrás pelo indígena Ibã Huni Kuin que resgatou, através da pesquisa com seu pai, cantos xamânicos tradicionais do seu povo.
Outro destaque do Masp foi a individual da artista plástica Macuxi Carmézia Emiliano. Carmézia é considerada uma pioneira entre os indígenas e já pinta telas há mais de 30 anos. Entre os temas de sua obra, estão as pinturas sobre o mito Macuxi de criação do Monte Roraima.
Seguindo a mesma tendência de reconhecimento de artistas indígenas, a Pinacoteca de São Paulo está ampliando o seu acervo com a aquisição de obras de nomes como Denilson Baniwa e Jaider Esbell, que morreu em 2021.
A antropóloga Elsje Lagrou (imagem em destaque), que há mais de 30 anos pesquisa a cultura de povos originários da Amazônia, avalia a importância da arte como instrumento de valorização dos territórios indígenas e da própria floresta: “A ligação entre a arte indígena contemporânea e as lutas em defesa do meio ambiente é totalmente intrínseca. Todos esses artistas trabalham a partir dos seus territórios, seus territórios ancestrais, cosmológicos e de pertencimento”, disse.
Elsje Lagrou também destacou o chamado “artivismo”, arte com ativismo, de indígenas como Jaider Esbell que denunciou, por meio de suas obras, o desmatamento e a pressão do agronegócio em Roraima, seu estado de origem. E do resgate promovido por ele de mitos indígenas como o Makunaimã, considerado pelos Macuxi como “grande criador e transformador”, mas que entrou para a literatura como Macunaíma, o Herói sem Nenhum Caráter, do modernista Mário de Andrade.
Na Pinacoteca de São Paulo, está em cartaz a primeira exposição individual em museu de Denilson Baniwa. O artista visual amazonense tem ainda uma trajetória reconhecida como curador e ativista, além de ser um dos fundadores da rádio indígena Yandê. Foi dele também a direção de arte da releitura crítica da ópera O Guarani, no Theatro Municipal de São Paulo, no mês passado.
“Eu visito vários tipos de museus no Brasil e sempre estou encontrando a produção de algum artista indígena. E a gente tem que lembrar que quatro anos atrás, isso não acontecia. Então, de quatro anos para cá, nós estamos ocupando uma série de espaços importantes”, avalia Denilson.
O episódio Arte Demarcada: o levante indígena nas artes do programa Caminhos da Reportagem, vai ao ar às 22h deste domingo (11), na TV Brasil. Clique aqui e saiba como sintonizar a emissora.