O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decidiu encaminhar neste sábado (7) a documentação do caso envolvendo a deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) ao Ministério da Justiça e Segurança Pública para o início de um processo de extradição.
Zambelli deixou o Brasil no fim de maio e está atualmente na Itália.
Neste sábado, Moraes também determinou que a deputada cumpra, de forma definitiva, a pena de prisão pelos ataques ao sistema do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Outro pedido do ministro foi feito à Câmara para que declare a perda do mandato da deputada.
Zambelli já é considerada foragida pela Justiça, uma vez que fugiu do país após a primeira decisão da Primeira Turma do STF, em maio, quando se tornou alvo de um mandado de prisão preventiva. O nome dela, inclusive, foi incluído na lista de difusão vermelha da Interpol, onde estão os foragidos internacionais.
Passo a passo para extradição
Os primeiros passos do processo de extradição são realizados com base na Lei de Migração. Neste primeiro momento, caberá à Secretaria Judiciária do STF organizar a documentação que será enviada ao Ministério da Justiça.
Serão encaminhadas as informações sobre as circunstâncias dos crimes, os dados sobre a pessoa condenada, a decisão e a pena aplicada (veja detalhamento a seguir).
O MJ vai avaliar se os documentos atendem aos requisitos da lei e repassar o pedido ao Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty). Caberá ao Itamaraty realizar o trâmite do pedido junto à Itália.
Nesta reportagem, o g1 vai te explicar como devem funcionar as próximas etapas do processo de extradição. Veja perguntas e respostas abaixo.
Qual é a base legal para a extradição?
Em primeiro lugar, é preciso entender a relação entre os dois países. Brasil e Itália têm um tratado recíproco de extradição, em vigor desde 1993 – e que já foi acionado dezenas de vezes desde então.
O tratado tem diferentes cláusulas, que levam em conta o tipo de crime, a localização do criminoso e até as possíveis variações de cidadania.
Como funciona o procedimento?
Dentro do Brasil
Até que o pedido de extradição seja formalizado na Itália há um processo interno no Brasil que precisa ser vencido.
É a chamada “extradição ativa”, que, pela Lei de Migração, começa pelo Ministério da Justiça.
A extradição ativa nada mais é que o pedido do estado brasileiro a um estado estrangeiro para entrega de pessoa com condenação criminal definitiva — caso de Zambelli — ou para fins de instrução de processo penal em curso.
A última decisão de Alexandre de Moraes dá os primeiros passos nesse sentido. O ministro acionou a Secretaria Judiciária do próprio STF para que ela organize a documentação para encaminhar ao Ministério da Justiça.
Os documentos a serem enviados devem ter, por exemplo:
indicações precisas sobre o local, a data, a natureza e as circunstâncias do fato criminoso;
a identidade do extraditando;
cópia dos textos legais sobre o crime, a competência, a pena e sua prescrição (em português e italiano); e
formulário para pedido de extradição disponível no site do Ministério da Justiça e Segurança Pública devidamente preenchido.
O Ministério da Justiça, na sequência, faz a análise da documentação enviada pelo STF. Isto é, se ela está de acordo com a legislação vigente e com os tratados envolvendo os dois países.
Até a última atualização desta reportagem, interlocutores do Ministério da Justiça afirmaram que o órgão ainda não tinha recebido oficialmente o pedido do STF.
Na sequência, o Ministério da Justiça encaminha o pedido de prisão ou extradição para o Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty), que é responsável por fazer a ponte com a Itália.
Fora do Brasil
Com o pedido em mãos, caberá à Itália decidir se aceita ou nega a extradição seguindo o que prevê o acordo entre os dois países e legislação própria.
Em casos de dupla cidadania da pessoa alvo do pedido de extradição, por exemplo, pode haver a “recusa facultativa”. Zambelli afirma que tem cidadania italiana.
Quando a extradição é obrigatória?
O primeiro artigo do tratado entre os dois países é bem direto: Brasil e Itália ficam obrigados a entregar, um ao outro, pessoas que estejam sendo procuradas pelo outro país – seja para levar a julgamento ou para cumprir uma pena restritiva de liberdade.
Essa extradição só ocorre a pedido – ou seja, o Brasil precisa solicitar que a Itália envie um brasileiro de volta, e vice-versa.
Para que o pedido seja atendido, é preciso que:
a conduta seja tipificada como crime nos dois países, e punível em ambos com pena de prisão ou reclusão de pelo menos um ano;
que, se a pena já tiver sido parcialmente cumprida, ainda restem pelo menos nove meses pendentes.
Quando a extradição pode ser negada?
O tratado prevê que a extradição não será concedida se:
a pessoa já estiver sendo julgada pela Justiça local (ou seja, o brasileiro esteja sendo processado na Itália por aquele crime, ou vice-versa);
se o crime ou a pena tiverem prescrevido pela lei de algum dos países;
se a pessoa tiver sido submetida, ou vier a ser submetida a um tribunal de exceção – uma corte criada especificamente para aquele caso, em vez do Judiciário convencional, o que é proibido no Brasil pela Constituição;
se o caso citado no pedido for considerado um “crime político” no país em que o criminoso ou réu está abrigado;
se o país que avalia a extradição considerar que o réu ou condenado será submetido a “atos de perseguição e discriminação por motivo de raça, religião, sexo, nacionalidade, língua, opinião política, condição social ou pessoal”;
se o caso envolver um “crime exclusivamente militar” – ou seja, um crime sem equivalência no código penal civil do país;
se o crime citado no pedido for punível com a pena de morte;
se houver suspeitas de que o réu não teve, ou não terá garantidos seus “direitos mínimos de defesa”;
se houver suspeita fundamentada de que o réu ou condenado será submetido a “pena ou tratamento que de qualquer forma configure uma violação dos seus direitos fundamentais”.
Dupla cidadania: ‘recusa facultativa’
O tratado prevê uma hipótese específica para quando o cidadão alvo do pedido de extradição for, ao mesmo tempo, nacional dos dois países. Ou seja, tiver cidadania brasileira e italiana.
Neste caso, os governos do Brasil e da Itália não são obrigados a entregar o cidadão para o outro país.
O tratado diz que, se negar a extradição, o país que recebeu o pedido deve submeter o caso às suas próprias autoridades de Justiça – que podem instaurar um procedimento penal local.
Como fica o caso de Zambelli, então?
Ou seja, no caso de Carla Zambelli, caberá ao governo da Itália decidir se envia a deputada ao Brasil ou se mantém a parlamentar no próprio território.
Se decidir mantê-la na Itália, o governo local tem várias opções: pode decidir pela prisão preventiva seguindo a legislação própria — e não a do Brasil — enquanto analisa o caso, ou deixá-la em liberdade, por exemplo.
Fonte: Jornal de MT